Arquitetura da Informação (em Português)

["mauro pinheiro" <mauro.pinheiro AT gmail.com>]

> Interesso-me pela Arquitetura da informação como o campo de estudo que
> investiga as formas de organização e estruturação da informação no
> ciberespaço. Assim, tenho concordado cada vez mais com a idéia que
> você colocou ao criticar o diagrama do Garrett que "internet não é
> prédio". A informação, como o Abel citou, é líquida. Escorre, vaza,
> entope, inunda. Acho que aí nós entramos, talvez não mais como
> Arquitetos da informação, e sim como "Encanadores da informação"  :o)
>
> Daniel Melo Ribeiro
> . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .


Essa citação do Abel, na verdade, me parece uma referência ao trabalho
do Zygmunt Bauman, sociólogo cuja análise da sociedade contemporânea
utiliza exatamente essa metáfora. Recomendo enfaticamente a leitura do
"Modernidade Líquida", que na minha opinião é o melhor (em Amor
Líquido ele perdeu a mão e falou de coisas sobre as quais não se
informou direito).

Aproveito para retomar um ponto que para mim ficou obscuro na
discussão - durante o Ebai e na lista - sobre a visão editorial na
construção dos sites. Eu concordo em parte com Cassiano,
especificamente para sites fortemente voltados para conteúdo. Mas há
um componente "tecnológico" que, me parece, escapa dessa visão
editorial, e isso é um fator muito presente no trabalho de arquitetura
de informação. A compreensão da web não só como um veículo de
comunicação, mas como um **sistema de publicação e armazenamento de
dados** é fundamental. Um sistema no qual precisamos encontrar
informações.

O que quero dizer é que, ao contrário de outras mídias, a web
pressupõe uma atitude ativa de quem a utiliza. Exceto nos casos em que
costuma-se frequentar sites específicos rotineiramente com expectativa
de ver "as novidades" que o site apresenta, navegar é buscar
informação. A busca é talvez a ferramenta mais importante da web - não
por acaso as maiores empresas atualmente são Google e Yahoo, que
começaram seus negócios com ferramentas de busca.

Como encontrar informação relevante na web? São milhões de sites,
sobre virtualmente qualquer assunto! Quanto mais específico o tema,
mais difícil decidir qual a melhor referência, qual o melhor site,
qual o caminho a seguir. Posso estar enganado, mas me lembro de um
momento no painel em que Cassiano disse que isso era um trabalho que o
Google resolveria. Mas o Google é limitado, e sua interpretação sobre
a relevância do site depende, entre outros fatores, de como o próprio
site é construído.

Não se trata, somente, de decidir qual conteúdo colocar no site. Ele
pode ser o MELHOR site sobre determinado assunto, mas se não houver um
conhecimento técnico de como construí-lo, poderá ficar soterrado na
lista de resposta de uma busca no Google, indo parar na segunda ou
terceira página de resultados.

O Peter Morville dá um exemplo interessante sobre um projeto
desenvolvido por ele para o National Cancer Institute. Essa
instituição tem um site com vários "mini-sites", um para cada tipo de
câncer. A proposta inicial era de reduzir o número de cliques
necessários para chegar nas páginas principais dos sites específicos,
a partir da página inicial do site geral.

A primeira pergunta que ele fez foi: como as pessoas chegam nesses
mini-sites? Os clientes não estavam preocupados especificamente com
isso...segundo eles, ao digitar "cancer" no Google, o primeiro
resultado era o próprio site, então, qual o problema?

Morville comenta que, apesar disso, normalmente as pessoas que têm um
câncer muito específico não costumam buscar por "cancer", e sim por
"câncer de mama", por exemplo. E nesse caso, o site do National Cancer
Institute ficava com uma relevância baixíssima nos resultados, apesar
de ser uma das melhores referências sobre o assunto! Em primeiro lugar
vinham sites mais comerciais, sites de fabricantes de remédios, sites
mais generalistas e pouco relevantes para quem buscasse informações
atualizadas sobre a doença.

Não se tratava de um problema do conteúdo dos mini-sites do National
Cancer Institute. Mas de como eles foram construídos, de não se levar
em conta o funcionamento da web como um sistema de armazenamento e
recuperação de dados. Por melhor que fosse o trabalho "editorial" de
produção do site, há um componente que escapa dessa visão. E no meu
entendimento, isso tem toda relação com o trabalho de arquitetura de
informação, que tem um "pé" na tecnologia, outro no estudo do
comportamento do usuário. Ao menos, foi sempre assim que eu entendi o
meu trabalho.

Em tempo: quem tiver interesse em saber mais sobre esse tema, sugiro
que leia o "Ambient Findability", do Peter Morville, editado pela
O'Reilly.

abraços,
mauro

-- 
prof. mauro pinheiro
universidade federal do espírito santo
centro de artes
depto. de desenho industrial